10 de novembro de 2012

" ESCOLA NÃO É EMPRE4SA "

“A escola não é diferente de uma fábrica de parafusos apenas porque nela se lida com seres humanos.” Um dos maiores estudiosos brasileiros em gestão escolar, Vitor Henrique Paro discorre neste artigo sobre a dimensão educativa da escola.

Por Vitor Henrique Paro*
http://blog.aticascipione.com.br

Ora, a escola é, sim, uma empresa, se considerarmos o significado geral dessa palavra. Ou seja, empresa é todo empreendimento humano organizado para a produção de algo ou para a busca de fins, com a utilização do esforço humano coletivo.

Sim, pode-se argumentar, mas a escola não é uma empresa como qualquer outra; por isso não lhe é apropriado esse título. Mas, na verdade, isso acontece com toda empresa. Uma fábrica de calçados, por exemplo, também não é uma empresa qualquer, diferenciando-se em muitos aspectos de uma fábrica de automóveis, de um banco ou de um hospital. No entanto, todas elas continuam sendo empresas, embora com características diferentes umas das outras.

Esse raciocínio, todavia, não deve satisfazer os defensores da natureza única da escola. Os que se acham comprometidos com o mundo escolar insistirão que existe na escola alguma coisa de especial que faz dela um empreendimento peculiar. Pode até não haver uma explicação racional, pensam eles, mas “sentem” que esse algo existe e não pode ser ocultado nem mesmo pelo discurso “técnico” dos gestores e burocratas fazedores de políticas públicas.

Um argumento muito usado para diferenciar a escola é que, diferentemente da empresa em geral, ela lida com seres humanos, não com simples objetos. Essa alegação é lembrada mesmo por aqueles que querem fazer da escola mero negócio; embora o utilizem apenas para parecerem piedosos ou para serem simpáticos à causa oposta, já que eles mesmos não o levam muito a sério em suas decisões.

Essa justificativa tem seu fundo de verdade, mas não consegue dar conta da questão. Afinal, toda empresa lida necessariamente com seres humanos. A escola não é diferente de uma fábrica de parafusos, por exemplo, apenas porque nela se lida com seres humanos. A fábrica de parafusos também só funciona com seres humanos, muito embora explorados pelos proprietários do capital. Na verdade, esse argumento parcial parece fundamentar a ação dos que querem fazer da escola uma empresa como qualquer outra, devotando aos professores o mesmo desprezo que o capital dedica aos trabalhadores em geral.

Ao tentar aplicar na escola as cínicas técnicas de “relações humanas” aplicadas na empresa produtora de mercadorias, os modernos ideólogos da gestão empresarial ignoram completamente a especificidade do trabalho que se realiza na instituição educativa. Essa singularidade, que o verdadeiro educador nem sempre sabe exprimir, mas sente que é real em sua prática diária, advém do fato de que, na escola, não há apenas relações entre humanos, mas um tipo único de relação – a relação pedagógica –, pela qual o próprio humano é construído em sua configuração histórico-cultural.

Não se trata portanto de negar à escola sua condição de empresa, mas de afirmar seu caráter de educadora. Certamente isso não pode servir de desculpa para não lhe dar um tratamento técnico-administrativo, aplicando a melhor gestão na busca de seus objetivos; mas esse tratamento deve ser de acordo com sua especificidade pedagógica.

A dimensão educativa da escola é muito mais complexa e grandiosa do que o propalado. O trabalho pedagógico só tem condições de se realizar plenamente se for de fato livre, não se confundindo com o trabalho forçado da produção capitalista em que o salário é a razão necessária e suficiente. A vontade soberana do aluno e a vontade soberana do professor extrapolam a motivação meramente pecuniária e não se satisfazem com os mais sofisticados mecanismos administrativos de uma empresa qualquer.
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*Vitor Henrique Paro é mestre, doutor e livre-docente em Educação. Foi pesquisador sênior na Fundação Carlos Chagas e professor titular na PUC-SP. Atualmente é professor titular (aposentado) da Faculdade de Educação da USP, onde exerce pesquisa, docência e orientação em cursos de pós-graduação e coordena o Gepae – Grupo de Estudos e Pesquisas em Administração Escolar. Publicou, entre outros, os livros Gestão democrática da escola pública (Editora Ática, 2000) e Gestão escolar, democracia e qualidade do ensino (Editora Ática, 2007).

DEZ RAZÕES PARA DIZER NÃO À REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

7 de novembro de 2012

O PREÇO DA SAÚDE

Por Hermann Hoffman – 01/11/12
http://pagina13.org.br

A saúde no Brasil é considerada um objeto valioso, uma mercadoria sem especificidades e um artigo de luxo que obedece silenciosamente a lógica do mercado, estando assim ao alcance de poucos que podem pagar por ela. A principal causa desta situação é o conflito histórico de dois projetos antagónicos: o público e o privado. O primeiro representa a gratuidade da doença pela falta de assistência cotidiana, já o segundo a venda da saúde como um ramo econômico rentável, suplemento do público e em continua ascensão no Brasil. Os tempos mudaram, se um dia alguém pensou que vender saúde era ser saudável, hoje não passa de práticas institucionalizadas com nota fiscal avalizada pelo poder público.

Neste caminho tortuoso e conturbado, o Estado – supermercado, dirigindo embriagado pela bebida privatizante travestida da solução, provoca os acidentes que poderiam ser evitados e não recebe punição, como diria a pesquisadora Ligia Bahia, “a seguir, trata-se de tentar vencer a corrida, sem olhar pra trás”. Dando continuidade as imprudências e na ânsia, como único que lhe resta, de dar assistência e esperança moral aos vilipendiados, o governo declama a célebre cantilena ministerial como verso: “o Brasil é o único país do mundo com mais de 100 milhões de habitantes que optou pela construção de um sistema nacional universal público de saúde, o SUS”, contudo apenas basta dizer que a porta-estandarte  SUS, a Atenção Básica, não aguça para a universalidade e o sistema não se apaixona pelo público, elementos fatais quem rompem com todo o discurso de construção profética da universalidade, integralidade, equidade e participação social no Brasil.


Ante o quadro dramático da negligencia estatal na esfera da saúde pública, o saldo é negativo. Surgem mais feridos e mortos no campo de batalha Brasil, que para muitos gestores não úteis, são apenas números estadísticos invisíveis. Paulatinamente a triste realidade o sistema de saúde que eles dizem público e único vai colapsando, sendo este colapso nutriente fundamental para as entidades privadas de assistência amplificarem seus circuitos mercantis e o imponente complexo industrial da saúde de alta tecnologia, daí vem o pior, todo este desenvolvimento privado, em detrimento do público, é dependente da bagatela financeira que o Estado investe na compra de serviços e insumos.

Contrariando escancaradamente o projeto 100% público da construção do nosso sistema de saúde como única alternativa viável na efetivação de políticas sociais que assegurem os direitos constitucionais a assistência à saúde é que no Brasil a saúde tem um preço. A lógica do mercado capitalista está deformando o SUS com a concordância de um Estado ineficiente, burocrático, centralizador e cartorial. Por fim, perguntaram a um ex-ministro da saúde do Brasil por que é tão difícil conseguir dinheiro para a saúde? “Porque para isso nós precisaríamos atingir essas categorias que fazem parte da elite financeira e econômica do país e essas elites são que sustentam as campanhas políticas”. SUPLEMENTANDO o raciocínio, estas elites são as donas da rede privada do Brasil. Elas ditam o preço da saúde e ordenam o valor do voto.

LOGIAS E ANALOGIAS

No Brasil a medicina vai bem
Mas o doente ainda vai mal
Qual o segredo profundo
Desta ciência original?
É banal: certamente
Não é o paciente
Que acumula capital.

Antônio Carlos de Brito

*Hermann Hoffman, sergipano, acadêmico do 5° ano de Medicina. É presidente do Núcleo Internacional do PT e titular do Conselho de Cidadãos da Embaixada do Brasil em Cuba