11 de maio de 2013

EUROPA AUMENTA CONSUMO DE CARVÃO MINERAL

O boom do xisto nos EUA favorece importações de carvão ‘barato’ pelas usinas da Europa

http://www.ecodebate.com.br
Fracking (fratura hidráulica), imagem em www.gaslandthemovie.com
Fracking (fratura hidráulica), imagem em www.gaslandthemovie.com

Gás de xisto nos EUA favorece usinas a carvão na Europa – O boom do xisto nos EUA continua a ampliar seu impacto, e um número crescente de geradoras europeias de energia estão sendo obrigadas a colocar em banho-maria suas modernas usinas a gás, incapazes de competir com as crescentes importações de carvão barato proveniente dos EUA. Matéria de Jan Hromadko, do Dow Jones Newswires / Valor Econômico, socializada peo ClippingMP.

A Statkraft, estatal de energia norueguesa, declarou ontem ter paralisado a operação de uma usina a gás na Alemanha, incapaz de competir com concorrentes a carvão. Já a alemã E.ON disse estar avaliando seriamente suspender as operações de outras usinas a gás, entre elas uma tecnologicamente avançada na Eslováquia.

Outras companhias de eletricidade europeias tomaram decisões semelhantes, colocando os formuladores de políticas diante de um dilema: energia mais barata produzida pela queima de carvão poderá proporcionar algum alívio às economias em dificuldades na região, mas especialistas do setor advertem que isso é incompatível com os objetivos de longo prazo em termos de emissões de carbono e do uso de energia renovável.

O fechamento de usinas em toda a Europa é outro exemplo do longo alcance do boom de oferta de energia na América do Norte. Os crescentes estoques de gás natural extraído do xisto por uma nova combinação de tecnologias denominada “fratura hidráulica” levaram muitas companhias de eletricidade nos EUA a abandonar o uso de carvão, que passou a ser exportado a preços baixos em crescentes quantidades para a Europa.

Em 2012, as exportações americanas de carvão para a Europa cresceram 23%, para 66,4 milhões de toneladas, segundo dados do governo dos EUA. Grande parte desse carvão está tomando o lugar do gás natural como combustível para geração de eletricidade. No Reino Unido, por exemplo, em 2012, a proporção de energia gerada pela queima de carvão subiu para seu nível mais alto em 17 anos, enquanto o gás caiu para um mínimo correspondente.

“A situação econômica de nossas operações na Europa, particularmente na geração de energia convencional, continua difícil”, disse o presidente da E.ON, Johannes Teyssen. A empresa informou queda de 94% no lucro operacional do primeiro trimestre referente às usinas que empregam a extremamente eficiente tecnologia de turbinas a gás de ciclo combinado.

“As empresas estão em dificuldades para operar usinas de energia acionadas a gás, mesmo em caso de operações modernas, tecnologicamente avançadas”, porque o carvão barato corroeu sua vantagem competitiva, disse Kash Burchett, analista da IHS Energy.

Os preços do carvão para entrega em um ano na Bolsa Europeia de Energia caíram quase 19% nos últimos 12 meses. Já o gás natural em grandes volumes na Europa continental tem seu preço fixado em relação ao petróleo, e o preço médio do petróleo tipo Brent caiu só 5%, segundo dados da BP.

Isso mudou a dinâmica do mercado de energia. A CEZ, companhia checa de eletricidade, disse na semana passada que poderá manter suspensa por longo período uma nova usina a gás que deveria começar a operar no verão, porque ela seria deficitária desde o primeiro dia de funcionamento. A SSE, empresa de eletricidade britânica, anunciou em março o fechamento de uma usina a gás, a redução da capacidade de uma segunda usina e o cancelamento da construção de novas usinas por vários anos devido à inviabilidade econômica.

O fechamento de usinas da E.ON poderia ter sido mais amplo se a empresa não tivesse firmado acordo com a agência reguladora da rede elétrica alemã e com uma operadora da rede para manter duas usinas a gás modernas, porém não rentáveis, em operação. A E.ON e suas parceiras nas usinas tinham considerado a paralisação das operações, mas a agência competente considerou-as cruciais para a segurança do suprimento energético no sul da Alemanha.

Segundo a Eurelectric, associação do setor de eletricidade na Europa, em 2010 – ano mais recente para o qual há estatísticas disponíveis–os 27 membros da UE geraram, respectivamente, 24% e 23% de sua eletricidade com base no consumo de carvão e de gás, com o restante derivado de um mix de energia renovável e nuclear.

O carvão barato não é má notícia para todas as empresas. A alemã RWE, maior produtora de eletricidade em termos de capacidade geradora, que produz mais de 62% de sua eletricidade da queima de carvão, informou neste ano que elevou em 16% a produção de eletricidade em suas usinas à base de carvão e de lignite em 2012.

A RWE espera ter lucro operacional inalterado em 2013, ao passo que a E.ON prevê queda de até 15% em relação ao ano anterior.

Poderão surgir também vantagens mais amplas. “No momento, a economia como um todo está se beneficiando da produção mais barata de energia”, disse Marcus Schenck, principal executivo financeiro da E.ON. Mas isso vale somente se “assumirmos que a proteção ambiental não é mais uma prioridade da política energética”.

A União Europeia comprometeu-se em reduzir suas emissões de dióxido de carbono em 20% em relação aos níveis de 1990 e, suprir 20% de sua demanda energética de fontes renováveis até 2020. Ontem, um porta-voz do comissário europeu de Energia, Gunther Oettinger, recusou-se a comentar as mais recentes paralisações da usinas a gás. Em entrevista em abril, ele disse que o bloco deve ampliar o foco de sua política energética, fazendo mais do que simplesmente reduzir as emissões de gases, para assegurar também que a energia permaneça barata.

Especialistas alertam ainda que o fechamento de mais usinas a gás poderá enfraquecer a segurança energética do continente, à medida que fontes intermitentes de energia renovável, como a eólica, tornarem-se mais disseminadas.

“Na prática, capacidade geradora intermitente exige alguma forma alternativa de segurança”, disse Burchett, da IHS Energy. A possível escassez de usinas a gás, que são ideais para ajudar a atenuar os desequilíbrios que podem ser causadas por mudanças imprevisíveis na disponibilidade de energia renovável, como a energia eólica, pode agravar o problema, disse ele.

A França está implementando um novo modelo de mercado que poderá oferecer incentivos financeiros para beneficiar empresas de eletricidade por que mantenham em operação usinas de reserva a gás, disse Burchett.

Na Itália, país que efetivamente oferece incentivos financeiros para manter em condição operacional as usinas de reserva, um porta-voz da companhia de eletricidade Enel disse não ter planos para suspender a operação de suas usinas.
Stop Fracking


EcoDebate, 10/05/2013

8 de maio de 2013

O TOMATE E A INFLAÇÃO

Inflação de alimentos no Brasil: não culpe apenas o clima,

por Caroline Stauffer e Silvio Cascione


 http://www.ecodebate.com.br
desperdício de comida

O Brasil, uma superpotência agrícola de altos e baixos com terras férteis em abundância, está lutando para fornecer alimentos de forma consistente a preços acessíveis para sua população. Reportagem da Reuters, no UOL Notícias.

Para entender como, considere o tomate.
Os preços da fruta vermelha dispararam 122 por cento em março ante o ano anterior, colocando-o na capa de duas revistas nacionais, estimulando relatos de tráfico de tomate da Argentina e acendendo indignação nacional sobre como qualquer produto poderia custar mais nos trópicos do que em, digamos, o frígido Alasca.

A produção do Brasil de commodities de exportação como soja, milho, açúcar e café está crescendo mais rápido do que em qualquer lugar do mundo, e ninguém está alertando sobre uma iminente escassez de alimentos em um país tão rico em recursos naturais.

Mas a maior economia da América Latina está se tornando um conto de duas contrastantes políticas agrícolas. Culturas de exportação são um modelo de capacidade tecnológica e alta rentabilidade, enquanto as fazendas responsáveis ??pela alimentação de uma classe crescente de consumidores permanecem quase nas mesmas condições há décadas: em sua maioria pequenas e familiares.

Oprimidos por dívidas, vulneráveis ??a danos do tempo e espremidos para fora de suas terras pelas culturas de commodities, essas fazendas são o primeiro elo de uma longa cadeia de ineficiências que fizeram os preços dos alimentos subirem em um país ainda marcado pela sua longa história de inflação galopante –complicando os esforços da presidente Dilma Rousseff para retomar o crescimento econômico.

“O governo não sabe o que é agricultura, ele só sabe o que é agricultura na balança comercial”, disse o agricultor Cyro Cury, que cultiva 10 tipos de tomates em uma fazenda em Salto, no interior de São Paulo.

“Não temos nenhuma estratégia de trabalho, nenhum levantamento de dados das regiões… A gente não pode ser chamado de celeiro do mundo, não temos as políticas para isso”, acrescentou ele, ao examinar tomates recém-colhidos das dezenas de estufas que administra.

Alguns dos problemas enfrentados pelos pequenos agricultores agrupados em torno de grandes cidades brasileiras, tais como mão de obra escassa e linhas de transporte pobres, também são sentidos por indústrias e empresários. É o chamado custo Brasil, que tem sufocado o crescimento econômico e tornou fazer negócios no país tão caros.

O governo federal em grande parte culpa o recente aumento de preços do tomate, da cebola e da cenoura –que ajudou a inflação em 12 meses a ficar acima do teto da meta do Banco Central em março pela primeira vez em um ano e meio– a fatores sazonais que não pode controlar.

“Houve alguns problemas em função da clima, um pouco da seca que aconteceu depois da chuva em algumas regiões. Mas é uma política bem definida para essas culturas através de linhas de crédito, intervenção por preço mínimo”, disse o secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Neri Geller, sugerindo que os preços irão cair em breve.

Há um consenso crescente entre agricultores e economistas, no entanto, de que problemas estruturais mais profundos, e não apenas chuvas irregulares, deixam o Brasil vulnerável à oscilação dos preços dos alimentos em um momento em que alguns poucos países comparáveis ??estão preocupados com a inflação.

Como em muitos países em desenvolvimento, a comida ainda é responsável por uma grande fatia do índice de preços ao consumidor do Brasil –22 por cento– e frutas e vegetais frescos são amplamente consumidos por todas as classes.

FALTA DE MÃO DE OBRA

Dentre os fatores que estimulam o alto preço dos alimentos está a falta de trabalhadores agrícolas em um país agora desfrutando de quase pleno emprego. Depois de anos de forte crescimento, as empresas de serviços têm atraído os trabalhadores não qualificados, oferecendo-lhes melhores regalias e uma carga de trabalho mais leve, muitas vezes dentro de lojas com ar-condicionado e não sob o sol escaldante.

“Hoje, o tipo mais escasso de trabalhadores no Brasil é o trabalhador não qualificado”, disse o engenheiro agrônomo Mauro Lopes, da FGV, no Rio de Janeiro.

Diferentemente de plantações de soja e açúcar de grande porte que são em sua maioria mecanizadas, bem capitalizadas e muitas vezes administradas por empresas estrangeiras, cerca de 60 por cento das fazendas de vegetais do Brasil ainda são familiares e contam com o trabalho manual.

Cury, o agricultor de tomate, disse que a escassez de tomates e preços recordes nesta temporada são principalmente resultantes de um surto de um fungo mortal, menos sementes plantadas com agricultores tentando emergir de dívidas e a crescente dificuldade em encontrar trabalhadores.

Ele diz que gostaria de plantar tomates em mais oito estufas nesta temporada para ajudar a atender a crescente demanda. Mas não conseguiu encontrar novos trabalhadores por um salário de cerca de 1 mil reais por mês.
Terras para culturas destinadas ao mercado interno também são cada vez mais escassas. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a área plantada com arroz e feijão –alimentos básicos da dieta nacional– caiu cerca de 30 por cento desde 1990, quando a população era 25 por cento menor.

No Estado de São Paulo, uma potência econômica que é o lar de 40 milhões de pessoas, campos de cana e laranjeiras dominam a paisagem. Açúcar e suco de laranja concentrado e congelado são as duas principais culturas de exportação para o Brasil.

“Há uma clara divisão na agricultura brasileira”, disse o líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), João Pedro Stedile. “Há 16 milhões de trabalhadores na agricultura familiar, eles têm apenas 15 por cento da terra, mas plantam 80 por cento do que é consumido no mercado interno.”

Cury e outros agricultores não podem se mover muito longe das cidades em busca de terras mais baratas e trabalhadores também porque os vegetais iriam estragar antes de chegarem aos mercados consumidores.
“As restrições de transporte são um problema crônico no Brasil”, disse o professor Geraldo Barros, da Universidade de São Paulo, em Piracicaba.

Embora os preços do tomate nos supermercados brasileiros tenham caído desde março, quando eles custavam mais do que nos supermercados no norte do Alasca saindo a cerca de 8 dólares por quilo, os preços da cebola permanecem em torno de 3 dólares por quilo, o dobro do valor na Cidade do México e três vezes o que custa em Lima.

Além da falta de trabalhadores, terra e dificuldade no transporte, há uma outra parte da história da inflação de alimentos no Brasil: a grande diferença entre os preços no atacado e ao consumidor. Ao mesmo tempo em que os brasileiros comemoram uma certa estabilidade e segurança no mercado de trabalho, parece que há sempre alguém disposto a pagar preços altíssimos para bens ou serviços.

“O poder de compra mais forte fez as companhias passarem todos os aumentos de custos para os consumidores, e também inibiu as empresas de baixarem os preços quando os custos começaram a cair no portão da fazenda”, disse o economista Mauricio Nakahodo, do Bank of Tokyo-Mitsubishi, em São Paulo.

Apesar de os produtores de tomate terem saudado os preços mais altos do produto neste ano, Cury disse que isso não vai fazê-los ricos. Uma caixa de seus tomates padrão no atacado custa 3,50 reais, mas estava sendo vendida por quatro vezes esse valor em um supermercado local, disse ele.

Cury afirmou ainda que a pequena margem de lucro limita a capacidade dos agricultores para aumentar a produção de alimentos para os brasileiros, garantindo um ciclo de preços elevados para os próximos anos, se nada mudar. “Se a gente não tiver uma política agrícola de pequenas culturas para garantir alimentação, nós vamos ter sérios problemas em 10 anos.”

(Reportagem adicional de Alexandra Alper na Cidade do México e Mitra Taj em Lima)
EcoDebate, 08/05/2013

7 de maio de 2013

PADRE JOSIMO, UMA VIDA PELAS VIDAS

Padre Josimo Tavares: 27 anos de martírio

http://www.ecodebate.com.br


Padre Josimo Tavares: 27 anos de martírio
Foto: Adital

Padre Josimo Tavares: 27 anos de martírio.

Gilvander Moreira

Feliz de um povo que não esquece seus mártires.” (Dom Pedro Casaldáliga)

[EcoDebate] Dia 10 de maio de 2013, antevéspera do dia das mamães, celebramos 27 anos do martírio do padre Josimo Tavares. Por isso o recordamos. Após tentativa de assassinato contra padre Josimo Moraes Tavares, no dia 15 de abril de 1986, quando cinco tiros foram disparados contra a Toyota dele, profundamente ameaçado de morte e de ressurreição, incompreendido até por colegas padres e agentes de pastoral, padre Josimo foi “intimado” a elaborar um relatório de suas atividades e a esclarecer as circunstâncias que levaram a tantas ameaças de morte contra ele.

Em seu belíssimo Testamento Espiritual pronunciado durante a Assembleia Diocesana de Tocantinópolis, MA, no dia 27 de abril de 1986, poucos dias antes de seu assassinato, dizia Josimo que sua morte estava anunciada, encomendada e prescrita nos anais das correntes que desejavam ardentemente eliminá-lo. Novos Anás e novos Caifás já o haviam julgado. Mas Josimo se encontrava firme, pois havia assumido o seu trabalho pastoral no compromisso e na causa em favor dos pobres, dos oprimidos e injustiçados, impulsionado pela força do Evangelho. Josimo declarou:

“Pois é, gente, eu quero que vocês entendam que o que vem acontecendo não é fruto de nenhuma ideologia ou facção teológica, nem por mim mesmo, ou seja, pela minha personalidade. Acredito que o porquê de tudo isso se resume em três pontos principais.

-          Por Deus ter me chamado com o dom da vocação sacerdotal e eu ter correspondido.

-          Pelo senhor bispo, D. Cornélio, ter me ordenado sacerdote.

-          Pelo apoio do povo e do vigário de Xambioá, então Pe. João Caprioli, que me ajudaram a vencer nos estudos.

“O discípulo não é maior do que o Mestre. Se perseguirem a mim, hão de perseguir vocês também.” Tenho que assumir. Agora estou empenhado na luta pela causa dos pobres lavradores indefesos, povo oprimido nas garras dos latifúndios. Se eu me calar, quem os defenderá? Quem lutará a seu favor? Eu pelo menos nada tenho a perder. Não tenho mulher, filhos e nem riqueza sequer, ninguém chorará por mim. Só tenho pena de uma pessoa: de minha mãe, que só tem a mim e mais ninguém por ela. Pobre. Viúva. Mas vocês ficam aí e cuidarão dela. Nem o medo me detém. É hora de assumir. Morro por uma justa causa. Agora quero que vocês entendam o seguinte: tudo isso que está acontecendo é uma conseqüência lógica resultante do meu trabalho na luta e defesa pelos pobres, em prol do Evangelho que me levou a assumir até as últimas consequências.

A minha vida nada vale em vista da morte de tantos pais lavradores assassinados, violentados e despejados de suas terras. Deixando mulheres e filhos abandonados, sem carinho, sem pão e sem lar. É hora de se levantar e fazer adiferença
Morro por uma causa justa.”

Mas ele não imaginava que a morte viria tão cedo. Dia 10 de maio de 1986, dia das mamães, padre Josimo foi assassinado covardemente enquanto subia as escadas do prédio da Mitra Diocesana de Imperatriz, MA, onde funcionava o escritório da CPT Araguaia-Tocantins. Ainda teve forças para entrar no hospital andando. Isso foi o que fazendeiros deram a dona Olinda, mãe do padre Josimo, no dia das mães.

Padre Josimo era coordenador da Comissão Pastoral da Terra – CPT – no Bico do Papagaio. O pistoleiro Geraldo Rodrigues da Costa efetuou dois disparos com uma pistola de calibre 7,65. Para executar Josimo contou com a participação de Vilson Nunes Cardoso, que até hoje está foragido.

Em 1993, nova denúncia, apontou como mandantes do assassinato de Padre Josimo, Geraldo Paulo Vieira, Adailson Vieira, Osmar Teodoro da Silva, Guiomar Teodoro da Silva, Nazaré Teodoro da Silva e Osvaldino Teodoro da Silva e João Teodoro da Silva. Em 1998 Adailson Vieira, Geraldo Paulo Vieira (pai do Adailson) e Guiomar Teodoro da Silva foram julgados e condenados. Os dois primeiros foram condenados a 19 anos de reclusão e Guiomar, a 14 anos e 3 meses. João Teodoro da Silva faleceu antes de ser levado a julgamento. Geraldo morreu alguns meses depois da sentença. Osmar Teodoro da Silva ficou foragido durante anos, sendo capturado pela polícia somente em 2001, depois de ter sido alvo do programa Linha Direta, na TV Globo. Em setembro de 2003, ele foi condenado, por unanimidade, a 19 anos de reclusão.

Geraldo Rodrigues da Costa, o executor do crime, foi condenado, em 1988, a 18 anos e 6 meses de reclusão. Conseguiu fugir da penitenciária por três vezes, mas, depois da última fuga, nunca mais fora encontrado. Há informações de que faleceu durante fuga após um assalto na cidade de Guaraí, Tocantins.

Em 2006, Claudemiro Godoy do Nascimento, no artigo “20 anos com Josimo”, recordava:

Há 20 anos atrás, o Brasil vivia momentos de transformações políticas e econômicas que dinamizavam o cenário das relações políticas. Na região do Bico do Papagaio a situação não se diferenciava. Com o anuncio do fim do regime ditatorial havia uma rearticulação política das oligarquias rurais na chamada Nova República. A luta social se encontrava diante de fortes momentos de tensão e conflito por parte de fazendeiros e trabalhadores rurais que tinham na Igreja, na CPT, nos sindicatos e nos novos movimentos sociais do campo uma esperança em ver realmente a Terra partilhada para todos e todas. Josimo é a testemunha fiel e nos ensina de que vale a pena dar a vida pela causa do Reino, das comunidades e do povo. Sua morte significou o compromisso assumido em denunciar as estruturas de morte alimentadas pelas injustiças políticas de mandos e desmandos de uma oligarquia rural que ousava (ou ainda ousa) se estabelecer no poder da República. É neste sentido que Josimo se torna o padre mártir da Pastoral da Terra ao selar com seu sangue uma opção, um compromisso e um engajamento na defesa dos oprimidos, em especial, os trabalhadores rurais. Poderíamos relembrar os versos de Pedro Tierra escritos por ocasião do martírio de Padre Josimo em maio de 1986: Quem é esse menino negro / Que desafia limites? / Apenas um homem. / Sandálias surradas. /Paciência e indignação. / Riso alvo. / Mel noturno. / Sonho irrecusável. / Lutou contra cercas. / Todas as cercas./ As cercas do medo. / As cercas do ódio. / As cercas da terra. / As cercas da fome. / As cercas do corpo. / As cercas do latifúndio.

Diante de tanta fé e de uma teimosia do Reino inexplicável, Josimo sentia-se fortalecido pela experiência de Deus, pois se encontrava dentro do próprio Deus. Com certeza, Josimo fez a experiência de Deus que somente os grandes místicos da humanidade fizeram. Um homem que chega a ponto de saber que terá seu sangue derramado em defesa dos pobres e pela causa do Reino só pode ter tido a experiência concreta do Deus que se fez gente entre os homens e mulheres.

Para Josimo ser padre significava sentir a vida brotando como serviço justo a Deus e aos pobres, sobretudo. Para ele, o culto, a eucaristia, a teologia do sacrifício significava o agrado que fazemos a Deus no serviço aos pobres, aos doentes e marginalizados da sociedade. Percebemos nos escritos, nos poemas e nos registros de Josimo uma profunda intimidade com sua opção primeira, a saber: a Diakonia, ou seja, o serviço, o estar sempre servindo aos mais necessitados. Necessitados do Bico do Papagaio eram os trabalhadores rurais expulsos e espoliados da terra pelos grandes fazendeiros locais e pelos políticos ao estilo coronelista. Portanto, ser padre Josimo era ser Profeta na Justiça, Pastor na Caminhada e Sacerdote humilde que procurava oferecer a Deus oferendas justas. Josimo é a própria oferta. Tornou-se um ofertório vivo para nossas comunidades e para a construção do Reino.

Com certeza, a memória dos 26 anos do martírio de Padre Josimo nos traz à luz a experiência das CEBs – Comunidades Eclesiais de Base -, da Igreja Povo de Deus, Igreja Povo Novo enquanto sinal do Reino de Deus no mundo. Novos Josimos só surgirão quando a Igreja novamente for sinal vivo do Reino de Deus, quando estiver ao lado dos pobres e oprimidos, dos fracos e perseguidos; quando denunciar as injustiças e as opressões cometidas contra o povo; quando anunciar a esperança, a fé, o amor e a alegria aos pobres.

10 de maio de 2012 são 26 anos com Josimo. Ele continua vivo. Vivo nas memórias do povo, nas experiências dos educadores populares, nos escritos da Teologia da Libertação e no compromisso dos poucos agentes de pastorais que continuam reafirmando o mesmo compromisso com o Reino, com a causa de um novo mundo, com a justiça social e a solidariedade para com os excluídos da sociedade. Vivo no martirológico latino-americano, alternativo por excelência, sem nenhuma ligação e reconhecimento por parte da estrutura eclesial oficial. A história não pode perder a figura de Josimo. Ele é importante na história porque promoveu com o povo a história. Com Josimo, os dominados contam suas histórias. Com Josimo, a história não é na lógica da classe dominante. Com Josimo, os dominados são os sujeitos históricos.”

O nome de Padre Josimo está hoje em centenas de Acampamentos de Sem Terra, de Assentamentos de Reforma Agrária e de Comunidades Eclesiais de Base. Ele está muito vivo e presente nos corações e na mente de milhões de pessoas que lutam para que a Mãe terra seja libertada das garras do latifúndio e partilhada com milhões de sem-terra através de uma reforma agrária popular, massiva e democrática.

Algumas pessoas nos alertam perguntando: “Por que valorizar tanto o martírio, o sofrimento…?” Devemos ser criteriosos para não incentivarmos um martírio voluntário. É claro que existem muitas pessoas que, de mil e uma formas, e não raro, de um jeito eficaz e abrangente, dão testemunho, dinamizam a vida, atuam na cidadania e constroem o bem comum. Não podemos também jamais esquecer a memória dos inúmeros mártires da caminhada. Ai de um povo que esquece os seus mártires.

José Vicente, compositor e cantor das CEBs – Comunidades Eclesiais de Base – diz sobre Padre Josimo: “Padre Josimo sofreu várias ameaças, dois atentados e foi executado à bala, por um pistoleiro, a mando de um grupo de fazendeiros da região chamada Bico do Papagaio no Tocantins, onde ele acompanhava toda a situação de conflitos pela posse da terra e pelos direitos dos trabalhadores, como membro da coordenação da CPT.

Como cantor da caminhada, movido pelo testemunho de Josimo, Zé Vicente compôs a música “Renascerá” em sua homenagem.

Renascerá, renascerá, o teu sonho, Josimo,
De um novo destino renascerá!
E chegará, e chegará tempo novo sagrado
Há tanto esperado, pra nós chegará!

Dona Olinda, mãe de Padre Josimo ainda vive e mora na região do Bico do Papagaio. Ao contemplar sua imagem tão pequena, cabelos brancos, silenciosa, vestindo a camiseta comemorativa, com a frase do testamento do filho: “morro por uma Causa justa!”, o nosso coração arde de emoção. Quem conviveu com Josimo diz: ”Ele era um poeta, tocava violão, gostava de escutar as histórias das pessoas, tinha um jeito manso, gostava de usar aquelas chinelas havaianas…”

Ao contemplar o pôr-do-sol na beira do grande Rio Tocantins, sob a lua nova que também deu o ar de graça sobre os presentes, a última estrofe do Samba pra Josimo irrompe na lembrança, como utopia teimosa, assinada com seu sangue há 27 anos.

Cada rio formoso lá do Tocantins
Levará teu sonho a todos os confins
E cada braço erguido, conquistando o chão
Terá as energias do teu coração!

Assim seja! Amém, Aleluia, Auerê, Uai!

Belo Horizonte, MG, Brasil, 10 de maio de 2013, 27 anos com padre Josimo Tavares vivendo vida plena.
[1] Gilvander Moreira, Frei e padre carmelita, mestre em Exegese Bíblica, professor de Teologia Bíblica; assessor da CPT, CEBI, SAB e Via Campesina; articulista do Portal EcoDebate; e-mail: gilvander@igrejadocarmo.com.br – www.gilvander.org.br – www.twitter.com/gilvanderluis - facebook: gilvander.moreira
1Frei e Padre Carmelita; bacharel e licenciado em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma, Itália; doutorando em Educação pela FAE/UFMG; assessor da CPT, CEBI, CEBs, SAB e Via Campesina; e-mail: gilvanderlm@gmail.comwww.gilvander.org.br – facebook: gilvander Moreira
2 LE BRETON, BINKA; Todos Sabiam, a morte anunciada do Padre Josimo, Ed. Loyola, São Paulo, 2000, pp. 129-130.
EcoDebate, 07/05/2013